Muito curiosa
esta afirmação de pacatez como causa – efeito, de uma ficção pobre nacional. Curiosa
porque vai contra uma certa visão editorial que privilegia o canto (e o conto) do
eu, a história centrada no eu quase terapêutico em detrimento da riqueza dos
actos e dos factos. A própria menorização da figura do conto é ela um paradoxo
só compreensível na visão de um mundo a duas entradas, de duas partidas
dobradas: o débito e o crédito.
Vivemos num
mundo normalizado e banalizado. A nossa linguagem é cada vez menos diferenciada,
cada vez mais apropriada. A própria condição autoral fenece cada vez mais neste
pulsar coletivo, já não de uma escrita muitas vezes reflexiva, mas de uma
reescrita de pedaços, como hienas, chacais e aves carnívoras que abocanham por
um momento de pretensa glória. Algo que angustia (passageiramente é certo) quem
ainda escreve, não como um industrial de fatos, mas como cerzideira com atenção
a cada ponto, de dedal na mão e não sem aquela «pasta» que adultera a verdadeira
criação.
Muitos vivem
hoje numa espécie de espaços lagunares onde os predadores e outros peixes mais
diversos e coloridos não entram, sem nunca experimentar as águas adjacentes com
mais nutrientes - mais revoltas e inseguras, é certo.
O português
não é mais nem menos pacato que o espanhol; nem mais ou menos alienado do
mundo; nem mais, nem menos mundividente ou cerceado de imaginação.
E basta estar
atento a algumas movimentações no palco social, para percebermos como a vida
também pulsa no rectângulo, cheia de diatribes, loucuras e outros castelos de
cartas sempre prontos a desabar… e a romancear.
O que talvez
tenha de mudar é o palco. Mas o palco, para nós, sempre esteve para lá da linha
do horizonte.
(Pobreza ficcional,
espanhol! Pudesses fazer como eu, que escrevendo já com uma coisa a que chamaram
de AO, o pude fazer hoje com o anterior só porque… porque me apeteceu! Vê lá se
também o podes fazer, se tens esta riqueza, ó espanhol?)
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