Numa linguagem que me está próxima, pelo menos na formação, diz Susana Araújo: “A poesia pode ajudar-nos a compreender o potencial disruptivo e criativo da própria crise". Analisemos pois, a sua tese:
Tu vacilas, não queres ouvir e eu
não vou ter contigo a meio caminho
deposta, abandonada e irrisória
a ponte de ferro quebra-se
assim que o FMI avança
Um casal ainda criança
já refinancia
os seus juros
Não há compensação
para quem sonha severamente
enquanto espera pelo autocarro
durante o horário de Inverno
Vê agora, lá fora: uma
família que forja falsetes
tenta agarrar-se à rede,
frívolos esforços em que
os nossos filhos falham
O estímulo ao investimento
de iniciativa privada promove
a utilização proveitosa dos nossos
recursos: como esta faca de cozinha
que avança para nós com serrilha, sorrindo
combinação certeira entre a ergonomia
o melhor design e a qualidade
Todas as domésticas suturas serão
submetidas a uma rigorosa
análise de sensibilidade
Dorme bem, meu amor e
deixa a manhã reestruturar
a nossa dívida.
[in Dívida Soberana, de Susana Araújo, Mariposa Azual, 2012]
Sem comentários:
Enviar um comentário