Citações:

Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo e do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à votante dos legisladores e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante
(José Pedro Galvão de Sousa, brasileiro, 1912-1992)

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Amanhe Ser: Reaprender A Ser Feliz

9. AMANHE SER: REAPRENDER A SER FELIZ
16-06-2013

Olho ao longe
E mais que um a Noite ser
Vejo um amanhe Ser
Lindo e Brilhante
Pois também
Reaprendo
A ser feliz.

Não há pranto
Que não esmoreça
Nem tristeza no olhar
Que não se abata.

Há sempre um
Novo e brilhante
Raio de sol
Que nos solta o olhar.

Não mais o engano
Nem a tristeza
E a amargura
No olhar.

Apenas o dia

E esse Amanhe Ser
Que sucede
A um a Noite Ser
Que parecia
Fútil
Cinzento
E sem esperança.
© PAS (Tempos, As Novíssimas Sombras; 2014; Pedro A. Sande; pg. 17-18)

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Gonçalo e Mia: Mas Mia, mia mais alto!

Artur: tem aqui um a seu favor. De facto os gostos são como as alergias. Comungo também consigo que uma focagem muito mecanicista, muito geométrica, muito fundada no isolacionismo da palavra, pode colocar aquele sabor amargo a papel de jornal, mau grado ser uma espécie de diário ou hebdomadário de referência.
O Gonçalo é sem dúvida um grande escritor, um escritor de características mais Nortenho do que Sulista, um académico, um filósofo, um exercitador de um mundo muito ligado a engrenagens, um mecanicista literário, onde o homem do Sul que vive na desordem e no caos se pode confundir. 
Um daqueles escritores que tanto exercita o génio, como comunga com o chato: mas todo o experimentalismo que tente esticar até à face escura da lua parece ser mesmo assim. É quase como confundir papel com moeda ou, obliterando uma ou duas das suas três funções, e, ou, não possuindo a percepção do mais significativo alicerce intelectual do interaccionismo simbólico, o insustentável pragmatismo tomado (tornado) no caos: uma espécie de criptografia Tomazziana .
Entretanto Raul, e fazendo um breve parêntese, enviei-lhe a horrível Obsessão… um pastel feito de Caos e Ironia, com algumas imperfeições que o benze Deus e uma certa ligeireza, esperemos não esquizóide e muito menos esquizofrénica. 
Temo pelo seu juízo crítico, uma grande prova a sua leitura, de uma obra leve, feita numa pincelada e fundada na observação, na incompletude e na ligeireza da ironia. 
Mas reitero que o senhor do senhor de Juarroz é notável, o que não significa que haja dias curvilíneos em que não haja pachorra para alguma rudeza da alma, como se a alma fosse uma linha recta. 
E vendo outros dias de génio em que a alma vai liberta no castelo da popa, como “aquela” extraordinária Viagem à Índia. Ademais, o senhor Tavares, é muito jovem, como se quer às actuais gestões de carreira e com enormes provas escritas: nem o senhor de Crato, o cruzadista contra as escolas de educação, se atreveria a colocar o seu génio à prova.
Com a aprendizagem do ajustamento ficaremos cada vez mais disciplinados e germanizados: e a obra de Tavares não terá em Portugal, em sequência, nos próximos cem anos, génio “à altura”.
E não é ironia, parece mesmo realidade, mesmo se para o meu gosto Couto Mia, mia mais alto!

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Vértice Com Vórtice Dentro!

Nem mais a propósito esse Vértice com este Vórtice dos tempos, que inevitavelmente será de recomeço.
A leitura de um escritor não se completa, ou esgota, na leitura de uma ou duas das suas obras.
De todas podemos gostar de forma diferente, mas todas nos dão uma percepção da capacidade de criação e visão do mundo dos seus autores.
Saramago é sem dúvida um dos maiores escritores portugueses de sempre.
Podemos não gostar dele pela percepção que temos de si como pessoa, ou da sua tomada de posição na cidadania, concordante ou não com o nosso posicionamento e o nosso lugar na matriz de valores actual.
Como pessoa não gosto das histórias ficcionadas (ou não) de algumas das suas posições na época do grande saneamento; mas já passou demasiada água pelas pontes para perceber que reserva não significa necessariamente antipatia e o seu antónimo é uma característica que privilegio. Afinal, ser-se agradável com o nosso semelhante é uma condição de inteligência… e não custa nada!   
Como romântico gosto do seu olhar com o aparente grande amor da sua vida.
Como escritor que é o que verdadeiramente interessa, gosto da sua inteligência posta ao serviço da sua obra, do seu rigor e trabalho de formiguinha que bem se percebe nos seus romances, bem como da sua cultura e da experiência de vida que denota.
A leitura calma e ponderada da sua obra permite-nos perceber como constrói e tece as suas tramas. Uma construção cuidada, recheada de conteúdo, recheada de reflexão, recheada de um olhar minucioso, como se rodando cada palavra e cada frase com olhar de artífice olhando-a cuidadosamente com esse olhar de artesão de vários ângulos.
Tendo lido apenas uma dezena das suas obras, nunca tinha lido o seu «Evangelho segundo Jesus Cristo». Não é fácil, de facto, no nosso limitado tempo de vida ler toda a obra de cada um dos autores, mesmo dos nossos preferidos. Mas este «Evangelho...», a par com o «Memorial...» e o «Cerco de Lisboa», é para mim (que isto gostos, embora potencialmente comuns, são em primeiro lugar apenas só nossos...), uma das suas grandes obras.
E bastava este excerto:
«José, Maria e o burro tinham vindo a atravessar o deserto, pois o deserto não é aquilo que vulgarmente se pensa, deserto é tudo quanto esteja ausente dos homens...» (J.S., O Evangelho segundo...; pág. 79).
PAS

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Comuns Mortais

Hoje não me apetece ler em Cracóvia mas escrever em Lisboa que é um lugar de poetas, escritores e outros artistas.
Nesta coisa de autores, escritores e egos há-os para todos os gostos. Os tímidos, os presumidos, os reflectidos, os que se elevam ao olimpo; e aqueles que percebem que a única diferença os separando do comum dos mortais é serem tão mortais e comuns como o mais vulgar dos homens.
A diletância e o autoconvencimento é um aparvalhamento do ser e uma tentativa tão pueril como triste de querer possuir só para si um olimpo que afinal não é mais do que a extensão de uma terra habitual.
Escrever não é relevância, mas paixão, e uma paixão que deve fazer perceber que colocar-se num pedestal não faz de nós mais do que comuns jarras de qualidade tão comum como a louça de que nos servimos todos os dias ao jantar.
Vem isto a propósito de alguma coisa para além de uma pequena menção à cidade da literatura e ao desamigamento de quem se considera especial?
Vem. Vem isto a propósito de uma sociedade feudal, exclusiva, petulante, sem dimensão humana. Uma sociedade que por aí pulula sem gratidão nos lábios e com ilusão nos rostos. Uma espécie de sociedade de Corte que se alimenta em pequenos círculos, excluindo e incluindo pelo seguidismo, pelo interesse e pela urgência em ser diferente e querer ser único.
Hoje, de facto, tive a prova de não passarmos mais do que gente comum.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A Economia das Palavras

Como gestor sempre fui adepto do «mais é menos». Mas como autor a viver há longos anos debaixo de água tentando adaptar as guelras para vir à tona para respirar um outro ar, tenho sempre dentro de mim a mensagem do inspirar, expirar, numa espécie de sinónimo de depurar, depurar... e as moléculas de água sempre me parecem infinitas.
A «economia da história» está assim em mim presente mais como um resultado de uma actividade profissional onde a economia é mais um conceito orçamental de denominadas boas práticas, que hoje se resumem quase e tão só a downsizings que se parecem restringir mais a núcleos desprovidos de outro tipo de corpos cavernosos.
Mas à economia das estórias sempre disse não, ou não tivesse na minha juventude sido leitor desse Livro Grande de Tebas, Navio e Mariana, do MC, que ampliava a minha imaginação e me fazia só pelo título fazer subir o Nilo numa faluca à procura da minha Cleópatra. Já naquele tempo era uma sorte de Osíris a julgar os mortos na «sala das duas verdades». Hoje sei que nunca são apenas duas, as verdades distenderam-se para além do inacreditável, como a água que se distende quando apertada entre dois dedos. E não me basta conhecer Tebas, olhar o cavername do navio ou desposar Mariana. Preciso de viver em constante psicostasia, colocado num prato remoendo as minhas quarenta e duas declarações de inocência. E é assim que menos será sempre mais. Porque mais é tudo o que a vista ou a mente não alcança, mas nos dá uma enorme sensação, inexplicável, de prazer, paz e felicidade.
Será que «Obsessão» vive dessa economia da escrita?

2

«Quando o relógio tocou uma hora mais, eu, Valente, tirei novamente umas folhas brancas: agora de dentro de uma mica, nome estranho para aqueles classificadores de plástico que tanto protegem o fruto das árvores como as asfixiam.
Agora era uma carta com várias folhas. Esta escrita à mão, como se a raiva nela contida necessitasse de menos tempo para ser aposta numa folha de papel. A impressão forçada de teclas diminuiria a raiva e falsearia a carta. Lembrei-me daquele escrito, «como se chamava?», o Ferreira, Vergílio de nome próprio, que forrara muitos troncos de árvore com as suas “Cartas a Nora”… Não! Esse era do Joyce! As de que me lembrava eram as “Cartas a Sandra”, uma morta que em vida não lhe largava por nada o alpendre. Mas a culpa, sabia-o, era sua, porque não a deixava partir definitivamente lá onde o sol se põe e a vida se renova.
Dizia a primeira destas novas cartas:
«Sónia, não sei se te recordas daquele dia em que te chamaram Reiki? Reiki, nome de deusa nórdica; Reiki, nome de guerreira; Reiki, nome de feiticeira, daquelas que nos fazem sonhar, armadas de uns calções que lhes marcam os lábios e as profundezas, daquelas que vomitam fora dos sutiãs dourados volúpia e prazer, daquelas que trazem um chicote pendurado e uma coleira e correntes para amordaçar, sonhos molhados, que nos enfeitiçam com dois dedos húmidos abertos passados lentamente pelos lábios. Eu estava atento, como estou todos os dias e procurava decifrar o mistério contido em ti.»
© OBSESSÃO de Pedro A. Sande

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Obsessão

E está lançado o Obsessão.
Trailer 2
http://youtu.be/2XJt0hZguZc

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segunda-feira, 18 de novembro de 2013

A Escrita e o Leitor

Num mundo em que está tudo dito de uma forma que extravasa muito as palavras (as imagens hoje substituem sem esforço o descritivo), só a criação de charadas (aquilo que alguns chamam de dramatização) será capaz, talvez, de dar oxigénio à forma escrita e literária. O excesso de intimismo, de pessoalismo, como forma mais individualista, são imagens com pouca nitidez, variedade, regularidades que os olhos captam, por excesso, cada vez menos. O leitor quer cada vez mais colocar-se ele próprio como o protagonista da sua leitura ficcionada.

sábado, 16 de novembro de 2013

Escolhas

A primeira vez que li Saramago, era ainda jovem, não tendo conseguido terminar o seu «Levantado do Chão.»
A minha formação de leitura tinha sido feita num grande ecletismo, baseada em historiadores, ensaístas, clássicos… desde a pura ficção até ao romance histórico, que devorava, desde Alexis e León Tolstoi, a Tchekhov, Dostoiévski, Hugo, Voltaire, Stendhal, Shakespeare, Flaubert, Balzac, Dumas, Dickens, Cooper, Hemingway, ...
Se Russos, Franceses, Ingleses e Americanos acompanharam essa minha primeira fase, à mistura com nomes como Jean Lartéguy, Irving Wallace, Huxley, Simonov, Sartre, Beauvoir, H. H. Kirst, Grossman, Jorge Luís Borges, Jorge Amaro, Kafka, Eco, Camus, Kundera e tantos outros, parecia não haver lugar para Saramago, destronado por Eça, Pessoa, Garret, Almada Negreiros, Vergílio Ferreira, Aquilino, Júlio Dinis, Herculano, Cardoso Pires, Manuel da Fonseca, Ferreira de Castro, Lobo Antunes, Bernardo Santareno, Branquinho da Fonseca, Mário de Carvalho e tantos, tantos outros… como António Sérgio, Vitorino Magalhães Godinho…
E isto para não falar nos grandes poetas como Junqueiro, Camões, Torga, Andrade, Sofia de Melo B.
Saramago era a minha pedra no sapato… como Camilo sempre foi, e ainda é, por mim um mal-amado.Um dia terei de o passar a pente fino, dando-lhe tempo de qualidade de leitura.
Logo após a sua consagração como Nobel, "peguei" novamente nas obras de José. E o que "vi" então, a partir do «Memorial do Convento», ultrapassada a sua estranha forma inicial de escrita (mais do quem dilentantismo, quase uma experiência de concentração e embelezamento do texto), as suas primeiras cinco páginas, foi um extraordinário escritor, um esforçado e verdadeiro trabalhador da escrita, culto, perfeccionista, onde cada palavra está isenta de crítica, repetição, escolhida a dedo como as melhores iguarias.
E hoje se tivesse de escolher alguns nomes da literatura mundial e nacional de todos os tempos (e como isso é ingrato, já que ficam sempre esquecidos outros nomes e outras paixões do seu tempo próprio, bem como a impossibilidade humana de tudo e a todos conhecermos), colocava Saramago no “meu Panteão estendido” de Pessoa, Eça, Herculano, Cardoso Pires, Truman Capote, Proust, Sartre, Vítor Hugo… PAS

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Máquina De Sonhos

Sempre vi a literatura como uma máquina de sonhos.
E se viver é bom, sonhar é melhor, porque acrescenta vida à vida.
Com o advento da televisão, os sonhos passaram a ser cada vez mais curtos. O mundo digital, os videojogos, onde sonhamos a comprimento, altura, e a que falta o terceiro plano da nossa infância, deram-lhe até outra duração ainda mais instantânea.
Assim, os sonhos encurtaram.
E à livralhada que se dividia em informativa ou literária, acrescentou-se uma nova grandeza: o meio-sonho … ou sono… que é uma espécie de descritivo de vida, nem meio adormecida nem meio desperta. Assim, uma espécie que alguns identificam como pesadelo, outros, apenas um estado de semi-adormecimento ou semi-vígilia , que nalguns casos nos pode transformar em garotas de programa, noutras em sonâmbulas perigosas, noutros, ainda, em inocuidades que anulam como as bases a acidez do caminho. 
PAS

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Apresentações

Ah, ah, ah! É capaz de andar lá perto, Severino. Muito bom este texto da Rosário que preenche mais um vazio nesta coisa da experiência do convívio com os livros.
Reconheçamos que entre estar a escrever um livro e a sumariar o livro, a primeira opção, leia-se invenção, é a que mais me agrada. O autor que odeia lançamentos lá terá as suas boas razões e possivelmente algumas bem substantivas que por certo partilharia.
No actual momento do país uma tal tribuna seria, para quem me quisesse ler, um verdadeiro tormento. Pois não lhes daria nem com o sumo, nem com um guardanapinho de papel (afinal os leitores se compram livros tem o direito, inalienável, de os poderem ler no recato do lar… sem serem defenestrados por autores que quase sempre são maus actores ou bichos de secretária).
Claro que usar verdadeiros animadores, ou mesmo passar por uma loja de máscaras e aparecer vestido de Zorro, Obélix, Lucky Luke ou de incrível Hulk , isso agradava-me. Ou mesmo, já que hoje em dia a diferença entre humanos e animais é nenhuma, sei lá, à Jolly Jumper , já que podia entrar sempre aos relinchos quando a voz me faltasse. Bem como satisfazia-me um chazinho e umas bolachinhas, daquelas de canela ou de areia tão ao gosto das ceias da avozinha dos meus tempos de infância, que as tinha diariamente em saquinhos, da padaria da esquina ao Salitre, seguido de um chá dançante e daquelas danças Cossacas tipo Kasatchok . E a fingir que ainda tinha os meus treze anos, ganhando coragem para convidar para dançar a mais loura do baile (e se naquele tempo as louras não eram mesmo louras, e os homens não eram mesmo morenos até morrer!), ao arcaico mas estimulante som do je t’aime … moi non plus ».
No meio disto, no entanto, sinto-me um raio de privilegiado. Nunca tive de passar por tal tortura, embora a altura se aproxime e já tenha preparado uma diatribe (ou um agradecimento) para quem fez de mim um exemplo de oportunidade a tempo inteiro… e siga a música: Ras , Dwa , Tri / C'est l'hiver qui frappe à notre porte / Mes amis , allumons un bon feu / C'est l'hiver , que le diable .

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Canção Do Mercado Interno


E o arquitecto não arquitecta?
Não porque não se constroem casas!
E o dentista não broca os dentes?
Não porque há quem já nem mastigue!
E os transportadores não transportam?
Não, porque fica-se em casa... anda-se a pé!
E o estofador, não estofa?
Não, porque agora não se mobila!
E o veterinário não vacina!
Não porque os animais são abatidos!
E o PT não muscula?
Não, porque já não há gorduras!
E as p. já não deputam?
Não, porque a libido definhou!
E o comunicador já não comunica?
Não, porque a mensagem vai via CTT!
E o vendedor não vende?
Não, porque se acabou o papel!
E o professor já não professa?
Não, porque o profe sobre de bullying!
E o fiscal já não fiscaliza?
Não, porque restaram apenas as sanitas!
E o polícia já não policia?
Não, porque lhes faltou gasolina!
E o poeta já não poetisa?
Não, porque lhe mataram os sonhos!
E o pintor já não pinta?
Não, porque lhes cobram os murais!
E o escritor já não escreve!
Não porque se acabou o leitor!
E o banqueiro já não se banqueteia?
Não porque se acabaram os depósitos!
...
E o português ainda vive e respira?
Não, porque o esbulham todos os dias! 
E o político ainda politica?
Sim, esse não só parasita como inferniza!  
PAS

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Palavras Feias

O uso corrente do palavrão ou palavra de baixo calão é muito interessante e revela a genial evolução do Homem e o polimento actual da humanidade. Na literatura infantil e juvenil com o argumento de não chocar as crianças e adolescentes, substituiu-se o baixo calão por grafismo: ossos, raios, crânios e o diabo a sete ficam à imaginação do autor.
Por um qualquer estranho motivo nos primeiros anos das nossas existências evitam-se os palavrões. «Muito bem!» pensei eu sempre. À medida, no entanto, que se entra num mundo mais evoluído e complexo os autores refinam-se. Tornam-se amigos de todos os diabos a sete, até aqui reprimidos, censurados.
É verdade que a vida é feita daquela espécie de esparregado (a que aqui chamaremos por causa das horas, de trampa), de filhos da mãe, de filhos de outros bastardos e de todos os parentes. Mas não existirão Eles e Nós, já desde que soltamos o primeiro arroto no berço, umas vezes sendo Nós, os infantes, outras vezes Vós ou Eles? Mas, se assim é, então porque desenhar ossos, crânios e raios, se os pudemos substituir já à nascença por falos, pequenas cabras e tudo o que a imaginação nos permitir.
E que estranha evolução é esta que nos faz sermos menos meigos à medida que nos crescem os ossos dos pés, os músculos do meio e as genitálias não diferenciadas? Dores de crescimento? Injustiças tamanhas? Caminhos a terminar em precipícios?
Da leitura das palavras feias da Rosário nem foi “gajo” (com mil raios e coriscos diria Haddock), o que mais me impressionou. Porque “gajo” pouco mais é do que alguém cujo nome se desconhece ou quer omitir.
Foi sim, “maltosa”, que é uma espécie de caterva ou súcia pouco recomendável, uma espécie de fungo ou bactéria que rapidamente pode alastrar às nossas doces, santas, angelicais crianças, cujo futuro não é tão risonho assim já que se antevê passarem em poucos anos a filhos de todas as mães e todos os pais.
Como ainda sou uma criança ingénua que ainda acredita que verga não significa mais do que isso, deixo-vos aqui um excerto dos meus "Pensamentos de Benjamin":

«Do nome dado à nave sabia que Catrina podia ter várias asserções: um diminutivo de Catarina — do francês Catherine —, um seio de mulher e ainda mais adaptado à circunstância náutica, uma espécie de roldana… ou aquilo que uma grande enciclopédia do futuro definiria de forma pouco clara mas sugestiva como «moitão de ferro manilhado ao chicote duma ostaga singela, onde labora pelo seio um amante de corrente a cujos chicotes manilham os cadernais das betas da ostaga, podendo assim içar-se a vêrga por um ou outro bordo a-pesar-de a ostaga ser singela».

Palavras feias?!

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Conversor de Austeridade em Oportunidade

Poema muito livre para converter em oportunidade a austeridade:

Se falta dinheiro nos cofres do estado taxe-se a música que dá nas calhas dos eléctricos, o vento que arrasta as folhas no inverno, o som dos tacões das mulheres nas calçadas, o ronco das barrigas dos esfomeados, o barulho dos clientes a gritarem "táxi", o crepitar das urnas nos cemitérios, a micção dos cães no espaço público, o chilrear entoado dos passarinhos, a caquinha entornada do céu por pombinhos, o espavento daquela assembleia a são bento, o grunhido esmagado da boca entupida do presidente, o arrastado baixinho do vento no buço das raparigas, a flatulência escondida no silêncio das "casinhas" dos prédios, o carcarejar das reuniões dos condomínios, o estrondo enorme do barulho do ajustamento, os suicídios pagos postcipadamente à entrada dos crematórios... e se ainda faltar dinheiro, olhem, deixem para lá, enviem o resto a pagar à ordem de fraulein... Merkel!
PAS

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

É Escritor Quem Escreve?

Ora vamos lá reflectir sobre isto: ser escritor é quem escreve? É! Mas, então, assim seríamos todos escritores? Pois! Então baixemos as nossas próprias expectativas. Chamemos a nós próprios, escrevinhadores! Há mesmo um amigo que lhes encontrou um termo mais escorreito: traças... daquelas que roem a celulose e são continuamente atraídas pela luz sem dela quererem fazer parte. E porque não? Porque sabem que se dela fizerem parte é porque já não são traças... mas ex-traças! Iluminarão uma vez? Exacto! Uma única vez, como o fulminante que nasce e morre no mesmo momento. E qual o critério para passar de uma designação à outra? O tempo… amigo! O tempo! O tempo e o leitor o ditarão! Mas são ambos corajosos? Parece-me que sim. Mas diria, por respeito a todos os que escrevem, que um escritor é um escrevinhador completo, do mesmo modo como um escrevinhador é um escritor incompleto. A persistência, o modo e o tempo se encarregarão de lhes prover um libré catita e as dragonas tão ambicionadas. Tanto uns como outros poderão ir para uma espécie de museus a que se dá o nome de bibliotecas. Uns serão devorados pelas traças... que criarão outras traças. Outros ficarão rodeados de pó. E não serão mais traças, mas uns minúsculos organismos chamados fungos ou bolores e que se encarregarão de lhes dar o destino devido: o pó, que não é mais do que traças e melgas condensadas no tempo.    

Pensamento de Madrugadas Altas

Pensamento de madrugadas altas:
Um escritor só é verdadeiramente escritor depois de perceber que escrever não é só colocar palavras à frente uma das outras, é mais saber retirá-las dos locais onde incomodam.
PAS

sábado, 19 de outubro de 2013

O Que É Um Escritor?

Caro Paulo
Tenho dez livros terminados e de três em três meses termino mais um.
Se sou um escritor daqueles que se badalam na espuma dos números? Não!
Se sou um escritor que escreve histórias esbracejando alegremente na sua imaginação? Sim! Glosando Jorge Amaro, sou um aprendiz do mundo até que deixe de escrever ou até que o mundo me diga: «basta, chega, que já tiveste o teu momento alto de prazer!» 
Sempre me perguntei: afinal o que é um escritor? Um homem livre com uma caneta na mão? Um paciente? Um médico? Um tipo que chega aos leitores, que os faz entrar no mundo dos seus próprios sonhos? Um tipo que escreve umas historietas e as vende aos milhares? Um tipo que promove a sua própria (auto) escopia? Um outro que faz da escrita um processo de exegese? Ou de gnose? Ou de terapia? Ou será que é um eremita? Um louco? Um criativo? Um copista? Um misto disto tudo, como aqueles pedaços de pão mais acabados, substanciais, que as simples tostas de fiambre ou de queijo? Há hoje uma linha ténue entre o escritor que é lançado para o mercado como um produto embalado e os milhares, milhões, que escrevem todos os dias, os seus dias, como diaristas, copistas vertebrados das suas sensações, enfados, alegrias e tristezas, que tentam invertebradamente afastar ao acordar, o remeloso dos olhos… e com ele… a solidão dos dias! Que ambiciosos de um tesouro, já há muito perdido, porque trazido à tona da descoberta, apenas saudosos de um abraço, de um afago, de que lhes chamem mestres, escritores, iludidos com um passado antigo como a do encanto de antigas hospedeiras, hoje transformadas, transformados, em comuns stewards, guardiões, trabalhadores rudes… da nossa imaginação.
A escrita como processo perdeu a virgindade, a nobreza, aburguesou-se, é agora um espaço comum para muitos que a julgam diferente, glamorosa, quando não é mais do que uma lamúria, um queixume de si mesma.  
Como se enganam quantos veem a escrita como sol e brilho, agora que a escrita, a literária, é apenas uma massa, um recheio, onde só uma diferença ténue no sabor, quase como uma descoberta feita do acaso, ou da conjunção dos astros, poderá alguma dia abanar o mais distraído dos leitores. E para isso é preciso paixão, persistência, desprendimento. Mas encontrar essa diferença ténue não é um objectivo, é uma missão de e para si próprio, de um cristo apaixonado pelo seu mundo que sabe o esperam mais espinhos do que rosas, mas que sabe estar em si ( e só para si!) a redenção.
Nesta perspectiva, meu caro, meus caros, só há um caminho para os apaixonados da escrita como fórmula verdadeiramente criativa: o tempo e a certeza de que escrever não é para redimir os outros, mas para nos redimirmos a nós próprios, apenas aos olhos de nós mesmos. Se os outros distraidamente captarem, olharem, ilidirem ou confrontarem por um momento apenas que seja, tanto melhor, que da nossa utilidade poderemos dizer que tivemos um pequeno ténue momento em contacto com os planetas exteriores, quando os astros se alinham e nos apontam os satélites de Júpiter ou os anéis de Saturno.   
PAS     

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A Cabana da Marta Wengorovius

Então, amigos, amigo Jordão, recostem-se lá aí num sofá e digam-me lá o que acham desta coisa estranha que me aconteceu:
Como decidi dedicar-me inteiramente a confeccionar livros, preparava-me para comprar uma daquelas casinhas da autoria daquela senhora com um nome aproximado a um violino Stradivarius : Marta Wengoroviu . Manias de um escrevinhador louco. Ainda estive a ver um T0 , mas decididamente teria de ser menos ambicioso. E, assim, nada melhor do que um T… e um quarto. Ainda me propuseram um T… e um terço, mas definitivamente já não se ajustava ao ajustamento. E sabemos bem como são estes lares que estão agora na moda.
Logo, a casinha servia na perfeição.
Como teria de vender os meus livrinhos, inteiros ou em folhetins, teria de mandar adaptar uma janelinha onde pudesse, tu cá, tu lá, barganhar pela portinhola tais preciosidades.
Algo que me preocupava, no entanto, era onde colocar as minhas pastas.
Como tenho todo o meu espólio dividido em três pastas, livros em fase inicial, livros em fase de acabamento e livros terminados, teria de prover para o começo mais espaço em cada um deles. Nos em fase inicial contei 29; na produção intermédia dos em fase de acabamento já só são nove. Nos totalmente finalizados proibidos de “de-puralina” contei apenas alguns em número par.
As coisas pareciam assim bem encaminhadas, e prontas para fazer a escritura, quando saiu um novo decreto de preparação do novo ano. Umas figuras muito queridas e risonhas chamavam-lhe orçamento… do Estado.
Encolhi os ombros, não percebia de que estado se falava ou se ainda havia algum estado, porque de estado só ainda tinha ouvido falar de estado de necessidade e de estado de banca e segundo ainda parecia… rota.
Terminava o tal de orçamento, abruptamente, com a cláusula de salvaguarda. Não havia mais salvamento, nem possibilidade de guarda, quanto mais de salvação. Estava tramado! Já só me restava um T… e um sexto.
Disseram-me entretanto que havia um sexto muito em conta que ficava na zona vermelha.
Achei estranho. Zona vermelha só conhecia uma zona que dava pelo nome de luz. Mas, enfim!
Como sempre gostei de usar vermelho, com excepção de quando ia passear para a campina com uma noiva que se chamava de Necessidade de Purificação, lá encontrei o edifício com um néon verde e vermelho, onde piscavam os seguintes dizeres: hostel.
De que tipo é que ainda não vos sei dizer, mas conto que lá figurem muitos livros com instruções de uso, de todos aqueles brinquedos excitantes, Toys ou lá como se chamavam, que vi nas fotografias da amostra e que tão diligentemente os publicitavam:
Excelente! E ainda há quem diga que precisa de uma cabana para se recostar a ler!
PAS

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Contato de espíritos

Muito interessante a interpretação de Barnes, mas um tanto elitista. Algo que não encontrei n’ "O prazer da leitura", de Proust, que confesso não conseguir largar da cabeceira. Para Proust não há ignorância de livros porque isso é mesmo, para um homem de génio, uma marca de grosseria intelectual e quiçá redutor do todo.
Para Proust toda a leitura e o saber conferem “as boas maneiras” do espírito.
E a distinção de Barnes, entre leitores preguiçosos e maus leitores, faz-me pensar no modo como abordo cada livro, tantas vezes de aparente forma preguiçosa, com uma atenção tão desprendida como se as palavras ficassem a vogar no espaço, distraído; outras, sorvendo devagar cada palavra e cada sinalética como se estivesse a decorar um lugar onde queira voltar… E já nem muitas vezes me preocupando em decorar o próprio título, já que os livros deixaram de ser caravelas, naus ou brigues… Interessa-me mais o mar onde elas vogam.
Ler torna-se, assim, um exercício de condução até uma estrada interrompida, onde mudo de condutor sentando-me agora ao volante, abrindo novos-atalhos, novas-veredas, novos-caminhos, sempre sem os olhos em qualquer auto-estrada que me dê o título de leitor não desprendido ou de cidadão respeitado da polis.
No respeito, até da leitura, perde-se tanto “as boas maneiras do espírito” e o paradoxo é que continuamos a precisar da preguiça do bom selvagem. Sem igual é tudo tão sem gosto como, aquilo que me confessava há pouco uma revisora-amiga, o sabor de um copo-de-água.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Abecedário do tempo e dos lugares

Num tempo social onde se plantou por engano um «s» de sucesso, onde o «s» de sociedade se confunde com o «S» grande de sucesso, o resultado fez-nos regressar à primeira letra do alfabeto: o «a»... de agressividade... felizmente bem perto do «a» maior do afecto.
Esperemos é não ter de passar por muito tempo pelo «a» de angústia, pois bem gostaríamos de abraçar no nosso tempo e por muito… um "H" grande mudo (mas sonoro nos corações) de harmonia.
PAS

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Ler Proust

Ler “O prazer da leitura” de Proust, esse prefácio para a tradução de “Sésamo e Lírios” de John Ruskin (escritor romântico inglês, poeta, desenhista e crítico literário e social) é ingressar num lugar brilhante onde a realidade é suplantada por esse domínio de capricho do pensamento. Em todos os lugares há frases que de tão intensas não podem estar guardadas a sete chaves… em Proust esse lugar parece um canteiro cheio de rosas bravas feitas crescer pela mão do homem. Uma dessas chaves é «estar no domínio do flutuante do capricho onde o gosto de uma única pessoa não pode fixar a verdade».
Uma frase a que, nos tempos que correm, devíamos prover mais reflexão e debate: é que o gosto, mais do que uma fixidez de olhar, é uma flutuação do mesmo… a que Proust chama capricho.
A outra frase já não é de Proust… mas trazida de Descartes: 
«A leitura de todos os livros bons é como uma conversa com as pessoas mais sérias dos séculos passados que deles foram autores».
E é essa conversa que agora Proust, aludindo a Ruskin, acrescenta: 
«A leitura é exactamente uma conversa com homens muito mais sensatos e interessantes do que os que podemos ter ocasião de conhecer à nossa volta»… e rebate: 
«É no momento em que nos disseram tudo quanto nos podiam dizer que fazem nascer em nós o sentimento de que ainda não nos disseram coisa alguma»; a verdade «temos de criá-la nós próprios»… e é no «termo da sensatez dos outros que surge o começo da nossa.»

domingo, 6 de outubro de 2013

O regresso com o outuno ao verão dos livros

Hoje passei pela Fnac do Chiado. 
Como de costume não me demorei no piso térreo, mas no paraíso que na FNAC parece uma descida ao inferno do céu.
A desumanização de que tanto falo e combato estava lá. 
Um livro do Valter Hugo Mãe, "Desumanização", cujo conteúdo entrevi sem opinião concreta, exceptuando a magnífica, excepcional capa.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Memórias...Picantes

Do meu livro em acabamento com o título provisório: Memórias!
- E tenho de escolher uma delas, meu comandante? O que seria dos meus camaradas, tão longe das alcovas das suas mulherzinhas legítimas, sem o alento da minha pena? Eu que só devo lealdade à minha poesia e à delicada manápula… que tanto serve para molhar a pena como a crica…! – versejou.
Aprestou-se a uma segunda pergunta, definitiva e final, para evitar males maiores: 
- E vou acompanhado pela Manteigui e pelo cafre, senhor Comandante? »
PAS

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Performance

Confesso que sou totalmente ignorante de tudo o que vem já devidamente ensacado dos supermercados, essas extensas quintas, onde os patos estão de pernas para o ar, as galinhas sem cabeça, os porcos com túbaros na boca, até os peixes a mergulhar em icebergues. O meu campo mais perto é o Terreiro do Paço.
Talvez por isso saiu-me logo após a leitura do comentário do nosso extraordinário amigo António Luiz e depois de ler um comentário qualquer facebokiano de um casal que se perdia fogosamente num empedrado do cemitério Père Lachaise entre Proust , Sartre e Moliére .

Meu amor
dou-te esta extensão toda
como prova de uma
vida em conjunto.
Gosto das batatas
que semeias
e das couves que regas
com tamanho fervor.
Às couves
dão-se repenicados
beijos
nas suas folhas
para ver se crescem,
às batatas
murros
para ver se estendem;
e uma cenoura agora,
tão linda,
para ver se te alindam
os olhos
e se te abre o
gineceu.
PAS

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Roteiros De Livros

Cada um de nós é um reportório de conhecimento. A história de um povo devia fazer-se na comunhão e intersecção de cada um dos seus pontos de vista e não na ilusão de quem se julga o povo todo! E a de cada um de nós... Que melhor forma de povoar por dentro ou por fora esses itinerários?
Neste momento estou na Flandres, em cima dos ombros do Gigante Mateus Mateus, uma estrada que a Drios abriu dentro e fora de nós, no nosso passado mas também no nosso futuro; e o que vejo conforta-me, afastando por um momento o verdadeiro delírio dos jogos florais, da mitomania, das selvagens como estalagem de luxo.
Acabei de sair de Cascais, virei para o Porto, retornei a Lisboa e a Vila de Alba, a reboque do Pedro Vilaça e da Leonor da Sandra. Aqui há itinerários de amor, de respeito, de amizade dentro e fora do livro, mas também já exclusivamente dentro dele, de ambição de poder, de ganância, do delírio que permite a abundância da mitomania, das estalagens de luxo, da selvajaria social como itinerário e constante destino. Este são os verdadeiros roteiros que estarão dentro do segredo do José Luís...e dentro do roteiro dos Livros.

História De Um Povo

Cada um de nós é um reportório único de conhecimento.


A história de um povo devia fazer-se na comunhão e intersecção de cada um dos seus pontos de vista e não na ilusão de quem se julga o povo todo! 
PAS

sábado, 13 de julho de 2013

Homicídio na Câmara Municipal

Duas horas dentro de uma banheira e, puf… o que restava do «Homicídio…» foi pelo ralo, ficando o “onde está ela, a Leonor?” Num primeiro momento ainda procurei um indício de continuidade, mas rapidamente penso ter percebido um trilho a desbravar (e a optar) da responsabilidade do leitor.  Li-o devagar, devagarinho… uma semana. Ao contrário de outros, onde as tramas se esgotam em duas noites e se misturam irremediavelmente com jorros de ideias irradiando dos livros como lamparinas mágicas de Aladino - espécie de subtramas interrompendo por breves momentos como interruptores, mudando de rumo, mesmo que a leitura avance e deixe largos espaços em branco da sua memória. O «Homicídio na Câmara Municipal» tem algumas bengalas provisórias que me fizeram sorrir, aquilo que em ambiente de formação se sabe ser uma inevitabilidade, um recurso, em simultâneo um «pain in the ass», mas também um apoio seguro: o terrível «escorreito», o simples «escarninho» e o incansável… «músculo cardíaco». Este último como um tecido que senti recorrente, privilegiada e posteriormente em José e no anjo do malvado franciú.
Reparo de um distraído abengalado na formação no, «portanto», «facto», «ok» - que não passou despercebido. Algo entretanto completamente benigno, que menciono tão só como curiosidade, porque as nossas bengalas são uma espécie de ADN da linguagem escrita e verbal, que fazem um «switch» quando mais precisamos.
Gostei também muito de uma frase colocada a páginas 60, «afinal o que sabe o presidente da Câmara Municipal…?» porque confirma aquilo que penso sabermos: sabem tão pouco os decisores dos seus eleitores e colaboradores, como muitas vezes nós, personagens singulares, dos nossos outros semelhantes. O espaço do conhecimento é pois assim um espaço de alinhamento da distorção. Achei ao longo da trama também curiosa a observação do poder como um afrodisíaco.
Como adoro sublinhar passagens, marquei também um termo que nos lembra que “a nossa escrita somos nós”, mas, acima de tudo, as nossas circunstâncias: o «desvio colossal», da página 132. Como devia a autora, como quase todos nós, estar nesse dia enquanto elaborava a trama do seu «Homicídio…»? Calculo, aborrecida com os falhanços das previsões de um eventual actual vizinho de uma outra Câmara, que se delicia por estes dias com a leitura do «financial times».
Como presumo quase todos os teus leitores, divido-me entre Leonor e a sua rival, embora a ascensão de Maria das Dores à Procuradoria me tenha enchido as medidas… Não havendo neste mundo anjos e demónios, que algumas das nossas dores sejam por uma vez levadas a Maria ou seja, neste caso, à Procuradoria - Geral, daquilo que ainda é uma república.
Em conclusão, diria que confirmava em linha recta a minha primeira impressão em diagonal e, a muita assertiva análise de Salvato, um dos apresentadores no dia do lançamento da obra em Lisboa.
  

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Ainda O Caminho Da Europa (UE)

Há um excelente livro de Paulo Vila Maior que segmenta as diferentes perspectivas teóricas da União Europeia e que nos dá uma extraordinária visão da complexidade desta Europa.

Porque a Europa é hoje um agregado de grandes complexidades feito de teorias parciais como o "consociationalism", mas também o novo institucionalismo, onde as instituições europeias são os protagonistas, com lógica da dependência instalada das instituições e dos agentes (e eles são tantos!), com poder concentrado em cartel de elites, com a (falta de) respeito do direito de veto mútuo, com teorias fusionais (influência indirecta de decisões de estados membros nos restantes)...

Bem como teorias caracterizadoras do processo, como o neo funcionalismo (a lógica do spillover), com o intergovernamentalismo liberal, com a governação supranacional... bem como as perspectivas metafísicas. O governo multinível, o Estado Internacional, o Estado Regulatório...

Ou seja a Europa (a UE) é hoje uma babilónia de poderes, lobbismos, comitologias, interesses unívocos estatais e a união na diversidade parece querer caminhar na união na univocidade, fazendo-nos crer que só a federalização e a concentração resolve o problema de uma europa construída na subsidiariedade, na lealdade comunitária, na cooperação, na coesão, ...

Ao homem consciente importa assim não deixar de visualizar (não ser ethnically blind mas também cultural blind) e apercebermo-nos da multinacionalidade e do multiculturalismo que nos tomou (deve tomar) o espaço.

Como diz o Mia Couto nas suas Vozes Anoitecidas posto na boca de Carlota Gentina, “Eu somos tristes … quando conto a minha história, me misturo, mulato não de raças, mas de existências”. Ser cidadão, “alma e lugar em mim”, é assim cada vez menos um constrangimento da nossa condição de nasciturnos num dado lugar, detentores de direitos de cidadania, esses direitos de primeiríssima geração. Já Pessoa em “desassossego” se tinha “da lei da Pátria libertado” quando exclamou: “A minha pátria é a língua portuguesa”. O seu céu, limitado só no tecto de nuvens, já extravasava “por todos os lados” por via de um intenso “caminheiro” criativo.

Os direitos culturais são, assim, na cidadania universal, uma espécie de filhos da globalização e do homem espalhado como verbo… naquilo que  Touraine dualiza como o “universalismo dos direitos e o particularismo dos interesses”.
A unidade na diversidade do projecto europeu só cambaleia na ignorância, medo ou no engano da superioridade ou inferioridade das almas.

Assim, cara Rosário “espete-lhes na consciência”  com alguns dos seus poemas!   

Europa Diferente, Exige-se!

Este post enquadra-se numa daquelas áreas extramuros que me entusiasma.
E que revela que, mesmo a leste, nesse leste que se libertou de uma economia castradora planificada para um sonho de uma economia totalmente libertária de bezerros de ouro, se começa a perceber que a Europa não pode ser só um projecto económico sem gente dentro.
E que a história da construção europeia nas suas raízes “queria” paz com desenvolvimento.
E que o desenvolvimento se faz no concerto dessa narrativa velha que é, a cultura, educação, investigação e inovação, não nessa narrativa bolorenta, amorfa, porque se confunde com intensidade e exploração, chamada competitividade. 


Godspeed, Rosário, e que se substitua com muito mais eficácia a tecnocratas grisalhos no pensamento, lançando sobre eles as suas flores, as suas portas e as suas janelas arejadas a ocidente.
Ainda, ontem, recuperando o livro e a cultura, estiveram muitos no lançamento da “Magia Das Chaves”, um projecto totalmente dedicado à Acreditar, que nos faz acreditar que a um país mesmo em resgate sobram créditos na construção de uma Europa feita à velocidade do verdadeiro sentido de humanidade – derrubadas as barreiras dos egoísmos, egocentrismos e narcisismos de um individualismo sem comunidade.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Colo

Daqui de longe com carinho
Penetro-te pelos teus olhos
E defenestro-te
De mansinho
A alma.
Não procuro
Honrarias nem prazeres,
Nos teus erros
E nos meus,
Apenas te dar um encosto,
Um colo cómodo,
Que te possa valer a tristeza
Que encomendas
E pagar a dívida
Que te devo.
PAS

domingo, 7 de julho de 2013

Num Dia De Escandaloso Calor Mais Uma Réstea de «À Procura de M.»

«Está tudo aqui escarrapachado, A. Os escândalos todos em que o nosso menino interveio. O escândalo Jardim Florido; o escândalo Submarinos Amarelos; o escândalo 3 P Gémeas, também conhecido como o escândalo Porra Do Alcatrão; o escândalo Luz E Ponte; o escândalo I Morais; o escândalo De Lima Ribeiro; o escândalo Da Mota Engenho; o escândalo Palácios Escolares; o escândalo Populo Grasso À Feira Do Populo Minuto; o escândalo BeCP; o escândalo Latrina Pia, também conhecido como Vergonha Pia ou Envergonharam A Maria Pia; o escândalo Porta Aberta; o escândalo Banco Barriga De Aluguer; o escândalo Dói A Arte Do Lima; o escândalo E Pulo; o escândalo TÊmMel, …»
«Mas tudo isso são, apenas, escândalos?»
«Não! Isso é o dia - a – dia: os escândalos vêm depois!»

terça-feira, 2 de julho de 2013

Onde Está a Rima?

A Rima é como o Wally e encontra-se em muitos lugares e apresenta-se de muitas e variadas maneiras.
Esconde-se e disfarça-se; e temos de a procurar e «fuçar» o nosso olhar em todo o lado como se perguntássemos: onde está a Rima?   

Se a rima é pecado?
Não é certamente
É sim um bom bocado
Que me lembra ser gente.

Lembranças, suaves,
Presenças amigáveis
Ternas «Provocacias»,
Lembrais meu bem passado.

Rimar é assim
Uma homofonia externa
De Tónica e fonema
Oh! Ó este verso branco, solto.

Das rimas perfeitas
Ou imperfeitas
Terras Raras, ricas de valores
Preciosas ou pobres

Ácidas,
Neutralizadas
Por bases
Esdrúxulas,
 

(Onde está a rima?
No topo da colina
Ou na mesquita
Ou na sonoridade
Do imã?)

Métricas, estrofes, ritmo
Tonicidade masculina aguda
Paroxítonas grave, feminina,
Sonoridade

E, ainda, a externa
A interna
A alternada
A, simplesmente, emparelhada.

E depois a interpolada
E Depois a encadeada
(Há quem a diga intercalada
Nesta rima eternamente, cruzada).

Ai a rima! Esse grande pecado,
Da poesia moderna!
Que reporta ao nosso estado,
Do calendário,

Da eterna e hodierna terça - feira!

PAS

sábado, 29 de junho de 2013

Distração, Alheamento, ...

Ainda não sei se lhe chamar «Distração» ou «Alheamento», mas como todos os livros terá de ter um título; arrasta-se vagarosamente a dois terços, mas lá chegará...
«Quando cheguei a casa despi a bata e tudo o que veio atrás e fui-me enfiar na banheira para me libertar, não só do cansaço, mas acima de tudo do morto. Em condições normais o meu alvo seria a cama tamanho médio dividida com a minha velha; embora àquela hora as pessoas normais estivessem nas suas lides normais laborais e não espetadas no vale dos lençóis: as que estavam, obviamente, porque muitas outras já não sabiam o que isso era há muito tempo; ter um emprego, com horário de início e fim era agora uma miragem para muitos e uma oportunidade na boca dos imbecis! E como neste mar de tubarões e de frágeis sardinhas, abundavam tantos chernes e pescadinhas de rabo na boca.» PAS

quinta-feira, 27 de junho de 2013

À DOriva

Navegas assim sozinha
Quando tens tantos capitães
E imediatos
para te ajudar a levantar 

o velame
da tua adriça.
Na tua dor 

até os teus sentidos adormeces.
Perdeste-te no quintal das coisas más
Onde o purpura se confunde com o rosa
E o rosa se desbota do branco

Não queres ajuda
Dos teus amigos,
Como se fundo do teu baú
Conseguisses desencantar
Um pedaço do teu orgulho
Rumando sempre de vela
Acessa

No caminho da tempestade
Em que te exauras.

PAS

Da «Preguiça» E da Escala da Medida Do Amor

«na frase de Bertolt Brecht: “Um homem tem sempre medo de uma mulher que o ame muito”.

«Sim, porque o amor é uma guerra. Uma guerra que as mulheres perdem por amar demais. E por amar homens que não as merecem. Ou homens que não merecem o excesso de amor, provavelmente porque o confundem com vitória. E para um homem, depois de uma vitória não vem paz. Vem sempre outra batalha e outra e outra, porque a paz é uma derrota e nenhum homem quer ficar refém.»

Muito curioso este conto que a Teresa aqui coloca. Muito curioso por asserções que como tudo na vida são meras regularidades sem comprovação à vista.
A primeira a de Brecht! De que homens falava Brecht? Como podia Brecht arrogar-se o direito de postular sobre o que se passa dentro de todo e cada homem?
A segunda, a do amor como uma guerra, que as mulheres perdem por amar demais! E por amar homens que não as merecem. Como se só as mulheres pudessem amar demais, ou os homens terem só mulheres que as merecem.
Pensou como os homens refractam as imagens, sejam de corpos triangulares, olhos de lince, ou cinturinhas finas e peitos firmes, suculentos. Como se os homens fossem por natureza predadores com presas sempre à vista e a vitória da conquista fosse um saciar de leão arrostando a presa a seus pés.
Puxou de um livro de notas, onde anotava as asserções que lhe tinham passado pela vista e pela vida.
Numa das notas, retirada de uma afirmação professoral, dizia: «a generalização é a arma dos ignorantes». Pensou um pouco. Sim, o contexto era diferente, mas podia adaptá-lo a os «homens são de marte, as mulheres de…». Sim, num contexto diferente.
«Mas não são as generalizações ignorância na totalidade das diferentes formas de amor? Estereótipos onde faltam homens e mulheres com outras formas exteriores e interiores? Ou excessos de imagens exteriores, valorizações deturpadas do belo e bonito?»
À sua frente um jovem casal brigava forte e feio. Ele, um daqueles garotos que cultivava o físico e metro sexualizava o corpo, sempre desejoso de um espelho que refletisse a sua imagem. Ela, uma rapariguinha excessivamente pintada e adornada, que seguia a moda da falsa construção da imagem e que acreditava que tinha encontrado o seu amor eterno naquele narciso de músculos temporários!

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Reencarnação

«José é um dos meus autores preferidos a par com Eça e Cardoso Pires; não foi um «gosto» fácil, mas um encontro tardio e demorado. Um daqueles «gostos» marcado por uma certa idade, onde à quantidade, que soçobra, se persevera, sobrevivendo, a qualidade. Com a maturidade veio a certeza que o trabalho dá frutos - e como José foi um trabalhador da escrita! - e a certeza que a própria leitura deve ser saboreada analisando a contra luz as suas propriedades físicas e estabelecida a química da sua identidade.
Pelos «90 anos do nascimento de José», eu José, filho e neto de austeros Josés, já tinha guardadas cem páginas de homenagem a este Josué da escrita, que avançam à medida da reprodução celular e de alguma intenção epistolar.»

O Luís Osório

 O Luís (Osório), escreveu hoje este texto que cai como uma luva neste meu pequeno poema.
«Sempre que o vejo dou-lhe moedas. É um ritual: pergunta-me se tenho um cafezinho, respondo-lhe que sim. Deixou de me agradecer. Há tempo que não o faz, é coisa mecânica, melhor assim – bebe o seu café, fuma o seu cigarro e eu lavo um cantinho de alma. Em dia de milhões pedintes acantonam-se às portas do jogo, sobretudo se no menu estiver um jackpot. Esmolas dadas por quem pede uma esmola maior. A lei da retribuição, consequência da consequência, dá-se para se receber em dobro, um investimento. Oferece-se uma moeda em troca do prolongamento de um desejo, não é um mau negócio. Fazer o Bem sem nada em troca é um campo para eleitos, apenas para uns poucos… gente de asas invisíveis, já não são daqui. A maioria de nós, mesmo os bons, grita por atenção e por um olhar que comprove o quanto valemos a pena.» Luís Osório
Sempre fomos mais os outros que nós próprios! Quem se esquece disso nunca será a boa moeda que afasta também ela a má moeda. Tudo uma questão de trocos e de dar visibilidade às nossas asas de anjos. É que elas estão lá, mas precisam de um sopro de alma!


Já te esqueci.

Foste como uma primavera árabe
Um vento do deserto
Que assobiou
Bem a meu lado.

Já te esqueci.

E repousas agora
De páginas abertas
E de letras às avessas
No meu caderno diário
Como um dos meus
Mais difíceis 
Estudos de Caso.

Já te esqueci.

Como uma aurora esperada
Que não chegou a acontecer.

Já te esqueci.

Repousa lá agora
Intocada,
No interior das minhas letras.

E a minha contemplação,

É apenas um exercício diário
Repleto
Da compreensão
Das tuas faltas.

E, no entanto,
Podia ter sido 
De outro modo

Se não te enganasses
Sem pudor
A cada passo.

Se entreviesses
Que recebe
Só quem dá

Com essa dádiva
Do céu
De só sermos nós
Sendo os outros.

De outro modo,

Somos pássaros
Enganados
Saltando
Entre a ramagem

Tropeçando
Em galhos
Frágeis,

Que se partem
A cada chegada 

E a cada percurso

De um novo voo.
PAS