Citações:

Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo e do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à votante dos legisladores e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante
(José Pedro Galvão de Sousa, brasileiro, 1912-1992)

sábado, 29 de setembro de 2012

Acordai!

Quando olho para onde olho, canso-me;
Canso-me da inacção dos que nada fazem,
Canso-me da acção dos que
Todos os dias se enganam,
Canso-me daqueles que se aproveitam
Do nosso olhar distante,
E da nossa maneira mansa de ser.

Quando olho para onde olho, canso-me:
Canso-me de pensar um país
Que se manteve calado tempo demasiado,
E que só de tempos a tempos se levanta
Para cantar:
 

Acordai!

(2012/09/29)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Cemitérios e Abrigos

Há aqueles a quem às palavras são dados abrigos individuais, E há aqueles a quem às palavras é apontada a indiferença do relento.
Vivemos tempos de mágoa de um tempo feio, que não se recorda de nos dar um só momento para podermos perscrutar descansadamente a beleza que gostaríamos de ter sentida e bem aconchegada ao peito.
Vivemos este vício pela manhã, e nada nos parece ser como aqueles dias dantes que inauguravam umas manhãs alegres, de umas férias grandes onde pulsava a espera da grande travessia do nosso contentamento.
Os abrigos estão hoje abandonados e onde os sabíamos construídos, há hoje apenas entulhos e lixeiras que a ignorância do passado está prestes a desenterrar.

PAS, (28 Set. 2012)

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Nenhum Homem É Uma Ilha

O texto de Michael Marshall que induziu «o postal» da Maria do Rosário escora no facto indesmentível de que, «Nenhum homem é uma ilha!»
O editor será por conseguinte um «bem» necessário, a tal primeira fila de espectadores calejados, por amor ou profissão, mesmo que o editor se possa dissociar no futuro das editoras «três em um».
Já a publicação tout court pode ir na voragem dos novos «veículos», já que a publicação sofre hoje de dois elementos «obstaculizadores»: a distribuição e a difusão que se têm de adaptar a uma sociedade global de nichos.
Muito do que conheço do «negócio» da edição devo-o à MRP e à minha pequena intuição de gestor, à generosidade que coloca nos seus posts extraordinários, que não se esgotam na divulgação das suas literaturas - a sua e a dos outros! (há uma generosidade que só é possível quando se atinge um determinado patamar de certeza, que podemos chamar de profissionalismo e intuição).
Esse patamar subimo-lo a pulso, através do esforço e desse tempo de duas faces, que nos dá sempre vida, mesmo se parecendo que se afadiga em nos tirar. A ampulheta da vida mesmo quando virada guarda sempre a mesma quantidade de areia, em que nos vamos transformando; e, no entanto, nós ali estamos prontos para assumir outra forma e condição.
Obviamente que há uma dimensão de gosto pessoal, mas essa dimensão de pessoalidade - há quem lhe chame gosto, não podendo ser denegrida - vai-se estreitando à medida da qualidade do editor, sendo substituído pelo tempo de ampulheta e pela qualidade do seu conteúdo.

Cantiga De Cura E BemDizer (4)

Anónimo!
Dá-te a conhecer,
Descobre-te,
Nessa tua carapaça
De cidadão eleitor,
Leitor,
Escritor,
E passarás a ter,
Não a maledicência e o escárnio
Que martirizam os dias
Mas uma amizade para sempre,
E poemas de amigo, de amor,
Conformes ao teu género e condição;

E a tua dormência para sempre
Curada,
(E bem cantada),
Por um qualquer
Desconhecido prosador!


PAS, 2012/09/23

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Cantiga De Cura E BemDizer (3)

(cont.)

Não! Não é isso que sentes!
Não te queixas
De desidratação,
Desregulação térmica
Contágio viral,
Fúngico,
Bacteriano, talvez?
Falta de nutrientes
Ou défice de oxigénio?

Tens antes a pele seca,
Escamosa, grossa?
Ou antes a elevação
E espessamento da pele
Das espinhas da tíbia?

Então a tua condição
É mais séria
Que se adivinha!

Mas olha, anónimo,
Se nada disto disser
Com a tua condição,
Não te amofines comigo
Que só te quero ajudar,
Eu que sou um doutor
Que sofre de depressão e demência,
Nervosismo,
Olhos salientes e avermelhados,
Confusão e olhar fixo,
Sensibilidade dos olhos à luz,
Pulso lento,
Numa pele húmida
Que me aparenta com um sapo
De charco,
Triste, confuso, encharcado
Num cinzento
E nebuloso dia de chuva.

(cont.)

PAS

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Quatro Anos E Meio de Batalha Contra As Mentiras, A Estupidez E A Covardia: A Nossa Luta?

É interessante saber que «Mein Kampf», de Hitler, era para ter tido um título "ligeiramente" diferente: 
“Quatro Anos e Meio de Batalha Contra as Mentiras, a Estupidez e a Covardia”.
Sabe-se isto da análise da sua biblioteca
Será que a «sua luta» poderia ter sido diferente na aceitação do outro (o povo Alemão) se o título originalmente pensado tivesse visto a luz do dia - em substituição daquele que acabou por ser impresso?

Cantiga De Cura E BemDizer (2)

(cont.)  
Anónimo!
Sofres de quê?
Que distúrbio é que te leva
A procurar-me?
Sofres de bócio, taquicardia,
Ou tens a tiróide tão inchada,
Que choras e lacrimejas
Mesmo quando o sol
Se agacha no teu delicado
Epitélio?
 

Anónimo!
Queres o quê?
Um diagnóstico?
Pois seja!

Tens a voz rouca,

A fala lenta,
A cara inchada,
Palpitações que te arrasam,
Caiem-te os pêlos das sobrancelhas
Ou tens apenas as pálpebras caídas
Prisão de ventre,
Aumento de peso?
 

Anónimo, queres o quê?
A cura?
Uma solução,
Uma ilusão
Para a tua tristeza?
Uma mezinha apenas
Para as tuas urgências?
Para estas últimas,
Que indiciam
Falta de movimento
Dos intestinos,
Aconselho-te dieta
E muitas,
Muitas drageias
De carvão!


(cont.)

PAS

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Cantiga De Cura E BemDizer

«Anónimo, o teu folgar
tenho eu por desacertado,
e ando maravilhado
de te não ver rebentar;
pois tapo com esta minha
boca, a tua boca, Marinha;
e com este nariz meu,
tapo eu, Marinha, o teu;»
 

Autor (Para Mim) Desconhecido


Anónimo!
Pedes-me um poema
Dou-te aquilo que sei dar,
Um epítome,
E mais aquilo que te posso dar
Que não te conheço a doença.
Um epítema
(Não confundas
Com o apótema
Da distância
Que nos separa)
Um emplastro,
Seja o que for!
Que não te conheço
A moléstia.


(cont.) 

 PAS

A LeYa No Rossio: Impressões «En Passant» e Descomprometidas

Muito interessante a iniciativa da LeYa no Rossio não só por propiciar objectos de sonho  a um preço simpático, como pelo debate que tive oportunidade de assistir sobre novos autores e suas dificuldades, moderado pela Maria do Rosário e pela Maria João Costa.
Deu para perceber que a LeYa pretende adoptar alguns das suas estratégias ao outro lado do Atlântico, bem como para sentir as diferenças dos novos autores - e de como as dificuldades da publicação são até mais graves do outro lado do Atlântico apesar da imagem de enorme pujança da América latina em geral e do Brasil em particular.
Num país cuja última sondagem revela já mais de 201 milhões de habitantes, os hábitos de leitura de uma sociedade imensamente desigual são ainda um travão à dinamização do mercado livreiro.  
Segundo a informação veiculada por um dos autores brasileiros, as tiragens são idênticas em número (médias de 3.000 a 5.000 por original segundo percebi), o que revela o que o Brasil ainda tem para andar nesta área - e apesar de nos últimos anos quase trinta milhões de habitantes terem sido integrados na «definição» de classe média, assistindo-se a um enorme dinamismo alavancado pela globalização e pela deslocalização dos capitais.  
Presumo também que o tema pirataria ainda cause mossa assinalável, embora se saiba que o Brasil tem evoluído muito nessa área. 
Muito interessante, também, a referência à falta de uma rede eficaz e suficiente de bibliotecas públicas, com as consequências que isso acarreta para a criação de hábitos e acesso à cultura. Isto em contraponto com a realidade portuguesa, cujo panorama sofre muito no contínuo choradinho nacional.
A intervenção do autor da Cidade de Deus prova, também, que para ser-se autor é preciso querer ser-se autor, o que significa que não é só autor quem pode, mas quem quer - e aparentemente entende que o mundo da escrita, hoje, vai muito para além do acto isolado da mesma;
(O livro mercantilizou-se, tornou-se um objecto não isolado do seu autor; os autores tem, na minha perspectiva, hoje, de enveredar pelo profissionalismo, que é uma forma singular de afirmarem o seu apreço à escrita; nesse aspecto identifico-me mais com João Tordo que, noto, adoptou uma escrita mais Anglo - Saxónica e uma ligação intemporal ao livro, voltada não exclusivamente para o autor, fugindo ao livro de autor muito voltado para o umbigo, muito terapêutico, mas fechado.  
A escrita é cada vez mais uma actividade profissionalizada, como bem mencionou João Tordo, um autor de quem li, O Bom Inverno - e termino o seu livro de estreia.  
O caminho de um a outro é evidente, e o Bom Verão e todas as estações que se esperam de João revelam isso mesmo: o caminho faz-se caminhando!
Gostei particularmente da intervenção do João Ricardo, do seu humor e da sua honestidade relativamente à carreira de escritor. 
Descomprometido com a escrita revela uma outra faceta da escrita actual. 
A importância do trabalho na escrita e de como se pode ser escritor com um trabalho honesto, mesmo sem ser um trabalho de grande craveira. 
Os génios não podem ser fabricados e numa sociedade cada vez mais diferenciada onde é necessário preencher os nichos (numa sociedade cultural de quarta geração) cada vez é necessário apercebermos que não um gosto, há gostos!   
Depois de ter lido na diagonal o seu livro, registo com o pouco que sei de João Ricardo Pedro, que lhe falta essa vontade inata de ser escritor - que assume de forma honesta - e algo que reputo muito importante na escrita e talvez enganosamente não vislumbro: alguma densidade poética e temperamento abstracto! João Ricardo seria para mim um tão bom ficcionista como um divulgador da sua ciência da engenharia.
Isso não retira, no entanto, capacidade a João Ricardo que, espero, possa me surpreender com um livro menos «fabricado em laboratório»: para primeiro romance e apesar dos dois anos de escrita é, no entanto, uma boa surpresa.
Gostei da intervenção da moderação que deu espaço aos autores para se fazerem conhecer e darem a conhecer algumas realidades actuais da sua relação com o mundo editorial.
Faltou (tempo e programa oblige) uma panorâmica sobre a relação futura dos autores com as editoras, o espaço das mesmas no futuro, a importância da distribuição, o fenómeno da concentração, o print - on - demand, o papel das editoras como interface com o público - que não faziam, obviamente, com muita pena minha,  parte do «cardápio» num dia soalheiro que foi dando lugar ao tempo fresco de outuno - pelo que dizer, «faltou!», é só a demonstração de um wishful thinking pessoal fora de qualquer programa anunciado.
Algo que me espantou nestes escritores foi a sua assumpção da lentidão na escrita - com excepção do João Tordo; não consegui perceber se a plasticidade e capacidade de assumir géneros diversos é também característica destes autores.
Em suma, tempo ganho e bem ganho, e não perdido, como se queixaram muitos autores que querem resgatar algum do seu tempo para a escrita e não para o que designaram de actividade circense (Neste aspecto penso que se tem de encontrar um ponto de equilíbrio entre o acto singular da escrita e a procura do leitor - cliente)... e um bom fim de tarde de Outono no Rossio. Mas é indubitável que o mundo, hoje, é espectáculo e marketing - que é uma outra forma, mais agressiva, da procura do outro - não nos procuramos nós - todos - no outro?
E é por isso que é preciso que nos Leyamos cada vez mais no livro como objecto! Estamos lá, todinhos, sem tirar nem pôr!
P.A.S.

sábado, 22 de setembro de 2012

Fim De Semana A Quatro

Junta-se Rentes de Carvalho e o seu Com os Holandeses, Gonçalo Tavares e a sua poesia, Investigações Novalis - cheira a laboratório farmacêutico, mas acredito que as drageias sejam coloridas - e ainda o iniciático, O Livro dos Homens sem Luz, de João Tordo, neste tempo de regresso de quase trevas e voilá... preenche-se umas boas horas de fim de semana para lavarmos a alma da política dos dias. 
O quarto? Bem, o quarto sou eu, nos intervalos a maquilhar o que há para maquilhar - e é muito! 

Sob Uma Chuva de Projécteis

Do meu próximo livro, «Sob Uma Chuva de Projécteis», em fase terminal:

 «- Alferes, volte para a sua unidade – ordenou de rajada o capitão no meio de um barulho ensurdecedor, como o daquelas rajadas de metralhadora sincronizadas que passam no meio das pás das hélices das aeronaves – E olho atento, que isto não indicia nada de bom. Se ao menos os tommies nos dissessem alguma coisa…  
Quando o Alferes se dirigiu curvado, por entre a galeria da trincheira para a front line, ainda ouviu um grito de maqueiros no sentido do que lhe pareceu a zona por onde tinha desaparecido a equipa de transmissões.
 Uns quilómetros atrás da linhas, onde isto se passava, num abrigo metálico com chapa de ferro ondulada em forma de arco, a que os soldados portugueses chamavam, elefante, a equipa de artilharia posicionava a peça para disparo.
- Dispare essas peças, tenente. Ritmo intenso, até nova ordem, sem pensar em poupar projécteis. Estão-lhes a dar forte e feio nas linhas da frente.»

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Viver A Morte Vivendo A Vida

Há dias que nos marcam o nascimento
Como há dias que nos irão ver morrer.
Mas nesse espaço há só dias
Que podem ser cinzentos
Ou recheados de alegria.
Este é um deles!

(Tão longe ainda do dia 
Em que marquei 
A minha morte.)
Mas eu acredito
Que o dia que me vir morrer
Será um dia alegre
E mais denso
Do que o dia em que ninguém
Por nascer,
Ainda nos haveria de ver
E conhecer.


(21 Set. 2012)

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A Minha Poesia Vem Quando Quer, E Não Quando Eu Quero

Qualquer ficcionista ou poeta, que não sou avaro na distinção, sabe que
Maria do Rosário Pedreira sabe-o melhor que ninguém e conhecendo a sua função terapêutica assume uma atitude onde o romântico funciona como lenitivo.

A poesia para mim sempre foi viver o mundo olhando-o do lado de fora e encontrar pedaços de mim nas pregas mais invisíveis.


Olhaste-me com essa mãozinha estendida
Como se quisesses segurar na música.
Vibravas com as palavras
Que não percebias
E balbuciavas:
Dá-me um abraço!

Maria Teresa Horta E A Modelação da Nobreza de Carácter

Para ele, Maria é apenas uma velha que não conta no balanceamento da sua ambição, na sua indigência intelectual e na sua vaidade.
Ele, que sempre modelou o rosto à imagem de um coração esvaziado, não tem pelos livros senão um respeito minguado, uma ida pobrezinha a uma feira pontal à espera de aplausos, própria de uma garotice que lhe adveio do caminho trilhado.

Na modelação da sua nobreza, Maria, que conhece da sua extensa obra o significado exacto da palavra dignidade, remata a sua obra solidária com uma maior: não conspurca a sua obra com a subserviência própria de quem não modelou a vida com carácter, nem se vende aos que desprezam os seus irmãos de outros caminhos, mas da mesma jornada. 

Testemunho: A Dignidade dos Indignados!

Quando Mona Lisa me abordou não estava voltado para conversa. Doía-me um molar de que desconfiava fosse um dente do siso. 
Na altura tive um comportamento não habitual em mim: um comportamento de distanciação como se aquela mulher não merecesse toda a minha atenção. 
«Que sim, anuía eu sem a ouvir! que sim, que estás carregada de razão! que sim, que isso não se faz!»
Quando olhei para ela foi a primeira vez que lhe senti uma tristeza profunda. 
Olhava-me como se lhe tivessem tirado um pedaço de vida. Vi-lhe escorrer pela tela uma lágrima.
«Porque choras?», perguntei-lhe.
Olhei para o meu lado e vi gente chorosa e um povo calado, indignado, com uma dignidade que arrepia.
«Porque choras?», perguntei novamente.
«Choro por um mundo que desaba novamente... devagar!», respondeu.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Mona Dali

Lisa.
Olha como carrego
Na palma da minha mão
Os seis dinheiros
Que me eram devidos.
Cuidaste de fazer esse sorriso
Enigmático
E não foste paga.
E é por ti
Que posei:
Pela vil exploração
De que foste alvo.
                                          (17 Set. 2012)

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Tu És O Meu Centro Do Mundo

Noto em ti que és um ser egocêntrico?
Nego! Nego com todas as minhas forças
Como se o sol tivesse pousado
Todos os seus raios em mim
E me devolvesse uma força inumana
E inquebrantável.

Nada para além de mim
Me acusa de egoísmo.

Eu sou o meu próprio egoísta
Um ser que resiste
A tudo o que o entedia
Anula e arrasta.

Notas em mim um ser egocêntrico?
Mas tu não és sol, nem terra
Nem mesmo a lua
Que míngua ou cresce.

Tu és apenas o cupido
Que se entretém a atirar setas,
E mesmo que vendado,
Tentas encontrar um lugar certo
Onde possas descansar de um certa anomia
Que te agonia do nascer do sol
Ao repouso autista da estrela e do astro.

Noto em ti que és um ser egocêntrico?
Notaria, se tu fosses não o meu,
Mas o teu centro do mundo.

(17 Set. 2012)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

A Civilização Do Espectáculo

Na página da Quetzal lê-se o que pensa Mário Vargas Llosa da banalização das artes e da literatura na 
«A Civilização do Espetáculo: A banalização das artes e da literatura, o triunfo do jornalismo cor-de-rosa e a futilidade da política são sintomas de um mal maior que afeta a cultura contemporânea: a ideia insensata de transformar a nossa propensão natural para o divertimento num bem supremo. Nos nossos tempos a cultura converteu-se num mecanismo de distracção e entretenimento. A figura do intelectual, que estruturou todo o século XX, desapareceu do espaço público. Mesmo que alguns assinem manifestos ou participem em debates, a verdade é que a sua influência é mínima. Conscientes desta situação, muitos remetem-se a um silêncio discreto.»
Não será esta visão demasiado egocêntrica, elitista e sebastianista?

Uma Nova Editora De Nome TroYka Ou Zero

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Já Então A Raposa Era O Caçador

«Ganhar dinheiro para quê, ASeverino?
Não vislumbraste ontem na intersecção da íris com a pupila do excelentíssimo ministro das finanças, o erotismo e sensualidade do modelo econométrico contido naquele tecido conjuntivo, contrário a qualquer aspirar de acumulação mesmo que regrado?
Queres uma coisa útil que Herta possa emprestar à sua Fraulein Merkel e aos seus pequenos pupilos: o «Economia Da Empresa», do José Mata, que explica a beleza da empresa em ambiente concorrencial, com o poder de mercado do monopólio, com a racionalidade, o comportamento oportunista, os aspectos dinâmicos da concorrência, o poder de mercado, a ineficiência, os interesses protegidos, a regulação, a captura da regulação e do regulador...»
«Não era nada disto de que estavas a falar, Severino?»
«Falavas de quê? Das garras da raposa? Peço desculpa! Trocou-me a austeridade, as voltas… pela sensualidade do lugar; enganei-me no sítio do comentário!»
Não li, mas que diabo, também não se pode ler tudo, porque neste momento destrói-nos as colheitas uma praga de coelho(s) enquanto as raposas dormem!

A Única Porta

Espera aí
À minha porta,
Que eu decifre
O que me vai
Na alma.

Não esperes,
Nem desesperes,
Porque essa
É a minha única
Porta.

Uma porta
Sem ferrolho
Que aberta
Te dá uma vantagem.

A de saberes
Que eu existo,
E me dou
Aos pobres.

Espera aí,
À minha porta.

E não a confundas
Com outra porta
Que não seja
Uma porta
Onde o amor
Respira e vive,
Protegida
Da inimizade
E do bolor
Dos dias.

Espera aí
À minha porta.

Que ta abrirei
Sempre que quiseres
De par em par,
Para que sejas
Uma e outra vez,
Minha,
E, se possível,
E me quiseres
Dar grande honra,
Grande Amiga.

(Ago. 2012)

Fifi, A Cadela Petulante

Era uma vez uma cadela
que se achava importante
detestava qualquer trela
que arrancava num instante.

Dona dona irritada:
- Ò Cadela petulante,
de crista levantada
e de focinho irritante!

- Encontrei-te escorraçada
sem esse modo elegante,
lá no caminho do nada,
não sejas mais arrogante!

E a pobre, emproada,
deu-se grata por viva,
e caindo em si, envergonhada,
rolou uma lágrima furtiva.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Carta Aberta de Eugénio a Passos Via Pitta


Eugénio Lisboa
Quem pode dizer que as peças literárias não são também luta e poesia?
Não é fácil ser-se educado no carácter: traz-nos muitos amargos de boca num mundo onde o carácter já é confundido com fraqueza ou falta de esperteza.
Tive esse privilégio: o de ser educado por um homem e uma mulher com princípios de honestidade, onde não faltava o conceito de honra e o respeito pelo seu semelhante qualquer que ele fosse.
Isso hoje perdeu-se: os interesses que têm de ser devidamente alojados e acomodados primeiro que todos os outros, principalmente se forem os nossos, bem como o cinismo, estão acima de tudo de um modo obsceno: mas há também a adulação e a bajulação filhos do mesmo par.
Talvez aqueles que gostem de poesia, sejam poetas por isso: talvez pelo carácter, sem o qual não haveria nada para trazer da profundeza das sombras, à superfície! 
Por isso quem espera, desespera!

As Palavras Velhas São As Mais Doces

Olhar para as tuas palavras
Fazem – me vir palavras
Como se o prazer encontrasse um lugar
Para se libertar;
Como se as tuas palavras despertassem um riacho,
Fluído, uma torrente magmática
Que queima a dor
E faz estremecer um vulcão de lava,
Que de lava só a pureza
Da emoção que liberta.
Olhar para as tuas palavras
É dares as mãos às minhas
Como se as minhas te percorressem
Com emoção
Curando-me as lágrimas.

Não te desculpes
Com a velhice das palavras
Nem com as dores
Que vos vão da cabeça
Ao ventre;
A vermelhidão
Que encontraste
Não foi mais que o rubor
Que me roubaste
Por te sentir ao perto.
Se olhares por cima
Do meu ombro
Encontras uma vaga,
Onde poderás repousar
O teu queixo, e não,
Não digas que não voltas,
Porque já voltaste
Só que de uma outra forma,
Mesmo que tenhas apagado
Da areia, os búzios,
Que chamaste à praia,
Onde sopramos palavras
Renovadas e jovens.

As palavras velhas
São as mais doces
Porque vêm enriquecidas
De vulcões improváveis
Que se levantam ao céu.

Acarinhemos pois estas palavras
Mesmo que sejam velhas
Cubramo-las de uma substância adocicada
Como se lhe pespegássemos
Um açúcar em pó, fino,
Da fineza das palavras
Que atraem
Como o amor que se liberta
De um só beijo,
Que estende um sulco
De que não vemos
Fim e caminho. 

(05 Set. 2012)

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Reciclagem Literária

Trazido à liça o novo romance de Afonso Cruz, O Pintor Debaixo Do Lava - Loiças, a Cristina das «Andanças Medievais», menciona uma coincidência de excertos.
Não é fácil o tema num mundo em que somos cada vez menos nós próprios, sendo nós pedaços e retalho de muitos; onde começamos e acabamos? De que massa somos feitos? Quem somos nós, afinal?

De qualquer modo e salvaguardada a coincidência, O Pintor Debaixo do Lava - Loiças poderia também, num mundo de ilusões e espelhos, se ter chamado, O Escritor Debaixo Do Lava - Loiças: uma nova forma de arte de recolha aproveitando cada resto orgânico daquilo que vai sendo tragado pelo ralo. 

Afinal, todas as nossas ideias estão à mão de semear, num mundo onde «nada se cria, nada se perde, tudo se transforma»; vivemos no tempo da reciclagem e da sustentabilidade humana. 

Por Quem Te Tomas?

Talvez seja de arrogância este olhar que tomo
Desta minha pequena janela,
Como uma escotilha fechada e estanque
Por onde observo,
Cada movimento
Cada lamento,
Cada passo dado,
Por um meu semelhante.
Assemelhar-me-ei eu a eles
Cheio de egoísmo, arrogância, medo,
Ou serei um lugar intocado
E verdejante onde posso me postar sossegado
A observar o trilho 

E o trinar
Manso dos pássaros?

(PAS, 06 Set. 2012)