José é um dos meus autores preferidos a par com Eça e Cardoso Pires; não foi um «gosto» fácil, mas um encontro tardio e demorado.
Um daqueles «gostos» marcado por uma certa idade, onde à quantidade, que soçobra, se persevera, sobrevivendo a qualidade.
Com a maturidade, veio a certeza que o trabalho dá frutos - e como José foi um trabalhador da escrita! - e que a própria leitura deve ser saboreada analisando a contra luz as suas propriedades físicas, estabelecida que é a química da sua identidade.
Pelos «90 anos do nascimento de José», eu José, filho e neto de austeros Josés, já tinha guardadas cem páginas de homenagem a este Josué da escrita, que avançam à medida da reprodução celular e de alguma intenção epistolar.
«Antes do mais deixem-me apresentar. O meu nome é Ramiro José. O meu pai é José Ramiro, um nome invertido no espelho, uma simetria distorcida, mas quase perfeita. Provenho de um longa lista de Josés que se vão imortalizando em primeiro ou segundo lugar, à vez, levados por uma vaidade familiar qualquer, mas também por uma certeza de sermos insubstituíveis e eternos, ligados por uma fina corrente ou um laço eléctrico qualquer. A minha profissão é estar vivo, sendo o guardião de todos os anos da minha morte, que é muito mais do que o contrário da vida.
Todos os anos são quase iguais, embora as trovoadas, a chuva miudinha ou intensa, o tempo tépido ou o calor abrasador sejam menos regulares ou intensos aqui e além. O que varia são os que nascem e os que morrem.
Quando morremos quase invariavelmente fazem de nós o melhor ser que pisou a terra. Mesmo que tenhamos sido os maiores pulhas, os mais belos narcisos ou outros corpos anti-sociais. A muitos que morrem levam-nos a dar um passeio pela primeira vez. Um passeio que teima em não ser longo. Pelo menos não com aquela dimensão que gostaríamos. Normalmente é um passeio de poucos quilómetros com algumas flores à mistura e também normalmente, para muitos que morrem, é a primeira vez que recebem flores…»
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