Duas e vinte sete da manhã. Página 41. Conheço-te melhor. Admiro a tua sobriedade, a tua lucidez, a beleza e riqueza do teu espírito. A tua testa antecipava-o. A inteligência nem sempre se pode esconder. Revelas em cada palavra beleza e determinação. E eu vou sorvendo com lentidão cada um das tuas palavras. Mas há mais, muito mais. Sempre há mais mundos num só mundo por descobrirmos. Basta estarmos atentos e nos focarmos.
Três da manhã. A almofada refila. Sente-se desacompanhada, inquieta, desusada.
Digo-lhe que não. Que é um coração que transborda. Perguntas-me de quê. Poderia te responder. Mas a páginas setenta não vou desenrolar citações, muito menos expor ilusões, sonhos ou segredos. Um ano de recomendações, de vivências, de experiências que me acautelaram a pele. O dia chega e a noite tarda. "Lê-me!" pedes-me, arisca, com um descaramento só teu.
"São só mais trinta páginas!"
Seja. Vemo-nos lá mais para a frente, quando o teu sol emergir ainda mais no meu céu.
Três e meia da manhã. A tua inteligência deu agora lugar à tua sensualidade, promovida no bom gosto. As palavras podem ser tão sensuais como providas desse gosto. As palavras têm até o condão de reunirem almas quase gémeas, sem o perigo de não se encontrar um subconjunto contido de elementos que se intersectam. Reunião e intersecção são divisores comuns, elementos proféticos de porvires. Beliscam e besuntam-me as tuas palavras, mas de afectos. A página cem e poucos do fim está perto e o toque das tuas palavras já há muito se entranha em todos os meus poros e vasos. A ventania é agora uma breve brisa, temo sempre o efeito do vendaval, mas da minha janela vem o som dos pássaros a anunciar primavera, um dos muitos abraços que irão, assim espero, aquietar os nossos invernos, um prémio mais de merecimento do que de consolação.
© PAS
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