Citações:

Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo e do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à votante dos legisladores e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante
(José Pedro Galvão de Sousa, brasileiro, 1912-1992)

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

O NONSENSE DE TODOS OS DIAS

Um livro que me deu um enorme prazer escrever.
A escrita também é isto: puro entretenimento para quem escreve!
Um livro ainda por anunciar.



DESTE VIVER AQUI NESTE PAPEL DESCRITO

Ao presente falta esse sentido de cuidado, delicadeza, urgência, constância, perenidade, pertença, domínio, permanência; como se tudo fosse agreste, efémero, suplementar, passageiro, despiciendo, utilitarista; como se todo o sonho fosse a prazo, esperando o seu pesadelo; como se a vida fosse uma tela onde se sucedem filmes e personagens, que se vão esgotando, que nos vão consumindo a cada passagem. Um sonho de mundo só poderá ser mais doce, profundo, inclusivo, agregado, não se demorando, distraindo, dividindo a cada esquina.
Cartas de Amor, de Lobo Antunes, vindo de um homem necessariamente profundo, sensível, confronta-nos aos olhos de hoje com a nossa actual existência, com um mundo cada vez menos romântico, mais cego, agressivo, individualista, utilitarista.
Que futuro mediará nas nossas vidas?!

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

AMOR DE GULA

Chamaste-me gula.
Disseste de mim o amante perfeito.
Como se o amor fosse um apetite somente,
Não um pináculo ou pincel de cerda
Que compõe diariamente com traços finos
Um quadro perfeito.

Chamaste-me gula.
Mas sinto que sou apenas o teu pano de sobra,
Embora tenhas tocado na lua do meu sentimento
Onde apagas tristezas passadas
E te pões conforme, 
Sempre à espera,
Do teu passado-presente.

Chamaste-me gula.
Eu chamo-te o meu amor-perfeito. 

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

BENJAMIN

«Os maços de apontamentos que tenho em cima da mesa, que hoje me fizeram perder tanto tempo à procura dos meus óculos redondos submergidos em tanto papel, são muitos e podiam perfazer quase trinta volumes. Falam de tudo e nada, mas acima de tudo declaram, exprimem, homens e a sua história. Mas falam também de peixes, é certo, em exortações que nos fazem temer estarmos cheios de escamas e espinhas, há quem lhes chame alegorias, outros menos dispostos a ouvir chamam-lhes sermões, sendo pouco condescendentes com o que chamam a interferência do homem na palavra de Deus.
Pode parecer estranho nestes tempos conturbados eu ter em minha posse esta enorme quantidade de documentos numa língua para muitos dos meus concidadãos estranha, mas não para mim, sem no entanto ter feito muito esforço para os ler e compreender como se já tivesse sido em tempos a minha língua natal. 

Do Brasil aos Açores, a França ou a Amesterdão os ensinamentos de Benjamin vogam em retalhos com o vento e ao sabor do tempo.»
(© Pedro A. Sande) de Benjamin

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

SERÁ A SIMPLICIDADE O SUPERLATIVO DA ESCRITA?

Diz a Licínia Quitério «Eu acho que a escrita chamada "simples" é a mais difícil do mundo. Bem me esforço, bem me esforço, mas não chego lá.» Esta é uma opinião muito enraizada no mundo da escrita, boa na percepção de que a escrita complicada não deve disfarçar uma capacidade de explanar ideias. Mas a escrita deve ser sempre simples? Se a simples lhe apusermos o significado escorreita, perceptível, talvez possamos tomar esta frase como um absoluto... relativo! Se a simples lhe apusermos o carimbo de o mais rasteira de lugares comuns, melhor. E isto porque a simplicidade pode ser também sinónimo de facilitismo, de alguma vacuidade no sentido da abrangência, dos públicos, da incapacidade de tocar mar-terra e céu. O mundo é cada vez mais um mundo diferenciado, diferente nos interesses, formulações, gostos, impedâncias eléctricas, onde os interesses se repartem, as tensões divergem. Afinal nem todos viveram vidas idênticas, tempos sugestivos idênticos, tiveram experiências idênticas, tiveram formações ou viveram em espaços idênticos. Facilitismo no mundo vivido, facilitismo na incapacidade para perceber o diferente?! Ousar realidades que nos são estranhas. Vidas e perspectivas quase alienígenas. Escrever um livro não é a mesma coisa que escrever dois, ou cinco, ou dez, ou quinze. A escrita do meu primeiro foi diferente da do segundo; como a do segundo do terceiro; como a do décimo ou do décimo segundo diferente das anteriores. Escrevendo, o autor vai-se apercebendo de novos territórios, desbravando caminhos repletos de inexperiências, comandando cada vez mais a montada por lugares cada vez menos estranhos, sabendo entretanto pela matemática que se tende para mas nunca se chega. Quando se chega é porque se morreu e aí, sim, haverá lugar à consagração de um caminho trilhado. Nem a escrita de um livro tem o mesmo propósito. Posso escrever para colorir a vida, para perceber a vida, para reflectir sobre ela. Quando escrevo sobre economia (apesar de um povo que tem feito um sobre esforço real sentido na pele), não espero que todos me percebam, se não fizer um esforço para escrever de modo a evitar o jargão subjacente a todas as ciências (ou pseudo ciências). A riqueza do mundo é a diversidade. Do gosto, raças, ideologias. Da falta de diversidade só nos deve tomar o tempo a bondade, a solidariedade, a igualdade que nos faz seres semelhantes.

ESCRITORES E ESCRITORES

Do ponto de vista do Priberam um escritor "é um autor de obras literárias ou científicas (com relação ao estilo e forma que emprega)". Faz o Priberam também a distinção do escritor público que considera um literato de profissão, ou seja, alguém que tem grande conhecimento de letras, literatura, que denota erudição, ou quem se dedica à escrita. O escritor será, assim, pois, esse último. Alguém que se dedica à escrita de uma forma apaixonada, muitas vezes visionária, outras, quase sujeita de adicção. Uma adicção de conhecimento da raiz da vida, do transporte para outras vidas, do sentido da vida, de suporte de vida - talvez de suporte para outras vidas impossíveis fora do corpóreo das nossas limitadas existências. 
Do ponto de vista do Priberam, que é um ponto de vista como tantos outros, há pois pelo menos dois tipos de escritores: os escritores que escrevem e os escritores que vivem a escrita. Às vezes interseccionam-se, outras são conjuntos indefinidos e paralelos.
  
Um autor é um agregador de palavras, de sentimentos, de expectativas, de vivências, um sintetista da palavra, da cor, da ilusão. Não somos escritores por sermos, somos escritores pela inflexão da nossa voz, pelo dorido dos nossos sentimentos, pela alegria do nosso olhar, pelo repositório da nossa saudade. Ser-se escritor será sempre um caminho, não o destino. Um verbo, nunca um substantivo. Uma esperança de sermos traduzidos, nunca uma consagração.

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

CARTAS DA GUERRA

O único guindaste da vida, aquele que nos eleva e nos leva a um lugar melhor é o Amor.
O Amor que nunca é uma forma lamechas de produzir virtualidade, mas o Amor como augúrio de um mundo futuro melhor.
Cartas da guerra, o filme, produzido com base nas cartas de Lobo Antunes a sua mulher é uma combinação da saudade com a virtualidade da palavra, um encontro do autor com a sua transparência e inquietude.
Podia como A Barreira Invisível de Terrence Mallick reproduzir um secreto lirismo com algum movimento mais visual?
Podia com certeza, mas, Ivo Ferreira, o realizador, vive num país de recursos muito
limitados, onde o sonho da grandiloquência desperta pela imagem real se fica quase sempre na virtualidade das palavras.
A não perder!